quarta-feira, 14 de setembro de 2011

50% +1 - Mais da metade da vida não acreditando, e sendo muito feliz por conta disso (Parte 2)


Bom, primeiramente, se você chegou aqui e ainda não leu a Parte 1 é só clicar aqui.

Agora se você esta com curiosidade de saber como a história continua, vamos lá.

Capítulo 2 - Largando a coxinha e encarando o suco de couve

Estou agora com cerca de 14 anos, isto me coloca na 8 série, não lembro muito bem se existiu um fato específico para eu começar a ter dúvidas em relação a, primeiramente religião e depois da própria existência de um deus ou algo parecido, mas lembro que foi nesse ano, 1995 que as primeiras dúvidas surgiram.

A religião formal começou a perder um pouco o sentido, lembro que um dos motivos que me fizeram olhar com outros olhos toda essa história foi o fato de uma de minhas avós viver pulando de religião em religião, catolicismo, evangélica, espiritismo etc.

Isso me chamou a atenção, tantas crenças, todas afirmando serem a correta e com preceitos tão diferentes uma da outra. Principalmente entre católica e espiritismo. Uma acredita em reencarnação e a outra é totalmente contra.

Como pode duas religiões que seguem basicamente o mesmo deus e seu preposto, o hippe Jesus, discordar em questões tão fundamentais? E se religiões parecidas discordam tanto assim, imagine as mais diferentes. Mas imaginar não era suficiente, resolvi pesquisar.

Naquele ano Internet ainda era algo precário, discada, não existia nem o verdadeiro omnisciente Google, utilizava basicamente o Cadê? para realizar as pesquisas já que meu inglês não era la essas coisas, então tinha que me contentar com o material em português, muito limitado e com pouca qualidade.

Mas foi uma época interessante, conheci um pouco sobre budismo, islamismo, judaísmo, mitologia grega e nórdica (aqui abro um parentesês, por qual motivo essas são tratadas como mitologia? Qual a diferença entre um cara que mora no Monte Olimpo e outro que transforma água em vinho), religiões primitivas, satanismo. Resumindo, era relacionado com religião eu estava lendo. E que engraçado isso, as contradições não só entre linhas distintas, como em denominações diferentes de uma mesma religião. E não eram apenas divergências a cerca de uma ou outra interpretação, eram dogmas completamente opostos que eram as fundações das crenças. Era impossível ser um mesmo deus. O que era permitido para um, podia te levar para o inferno no outro.

Fui me aprofundando mais, afinal, queria saber qual que era o deus verdadeiro. Já pensou passar a vida inteira seguindo os mandamento de um e no final das contas, não ir para o paraíso por que comia Bacon? Duro né?

Nessa “investigação”, vamos chamar assim, uma coisa começou a ficar muito evidente, o deus verdadeiro, era o deus do local e época em que as pessoas nasciam. Então a pessoa que nasceu no império Asteca e achava ok arrancar o coração do outro para oferecer a Huitzilopochtli estava errado? E ele ia para o inferno por causa disso? Mas ninguém contou para ele a regra do jogo. Era justo isso? Comecei a achar que não.

E quanto mais pesquisava, mais encontrava semelhanças que eram praticamente cópias, e diferenças incompatíveis entre as mais diversas crenças. Algo não cheirava bem.

Paralelamente a isto, fiz a tal da crisma, não lembro muito bem dela, afinal, eu fiz por que todos os amigos fizeram, e era na escola, e tinha meninas nas classes. Mas digo que na época da cerimonia, eu já tinha quase me convertido completamente.

Mas até ai, a minha busca era para tentar descobrir o deus de verdade, ainda não me passava pela cabeça a hipótese dele não existir.

Foi quando em uma dessas navegadas no período da tarde me deparo com um site, com um nome que me chamou a atenção, Sociedade da Terra Redonda, a STR. Confesso que sempre abro um sorriso quando lembro, guardo esses primeiro contatos com a comunidade ateísta com um imenso carinho.

Não sabia que se podia não acreditar em nada. Nunca  havia convivido com nenhum ateu, tinha uma percepção que o ateísmo era uma corrente do satanismo ou coisa parecida. Até que comecei a ler os artigos, as frases, me inscrevi no grupo de e-mail, o qual participo até hoje, primeiramente, apenas como observador, depois escrevendo uma ou outra coisa, e sendo massacrado pela falta de lógica.

Uma coisa tenho que admitir, não é fácil se tornar ateu. Os ateus, e me incluo nessa, são seres um pouco arrogantes por natureza, apesar de querermos que o mundo se torne ateu, não fazemos questão nenhuma de facilitar o caminho para isso. E acho isso correto, é algo que tem que ser concluído, conquistado, não pode vir de graça. Eu gosto de fazer a seguinte comparação, a religião é a coxinha, o pão de batata, o refrigerante. É gostosa, conforta, fácil de digerir, satisfaz de uma maneira rápida, tem a complexidade de um pão de queijo. Porém, e tudo tem um porém, vira gordura, vai pra barriga, te deixa preguiçoso e no final das contas, não te dá todos os nutrientes que você precisa, apenas enche sua barriga. Já a conversão para o ateísmo é o suco de couve, a salada crua, o levantar as 5:30 da manhã para ir a academia. É dolorido, desconfortável, não tem nenhuma preocupação se você vai achar gostoso, mas te da todos os nutrientes, melhora seu coração, te deixa com um corpo legal, e vai te levar a viver um bocado. Portanto, se você que está lendo aqui não é um ateu e quer saber por que motivo somos tão orgulhosos, tente imaginar o orgulho que um cara que pesava 250 kilos teria se depois de muita dieta e exercício, sim por que nesse caso não existem plásticas nem remédios para fazer o processo ficar mais fácil, passasse a pesar 85 kg, com um corpo todo definido. Então é bem por aí.

Acho que dei uma divagada, mas vamos voltar a história.

Mesmo com todas porradas que tomava no fórum e na lista, eu resolvi continuar escrevendo e dividindo meus pensamentos, afinal esse era o meu único contato com esse mundo descrente. Mas passei a tomar alguns cuidados, o primeiro foi decorar a lista de falácia, afinal, nada pior do que ter uma argumentação desacreditada por um ad hominen ou pior um non sequitur já no primeiro parágrafo. Depois foi começar a me informar mais sobre os temas que ia dar o meu pitáco. Mas muito da racionalidade e poder argumentativo que tenho hoje se deve a esse início nem um pouco afável.

E posso dizer que chegando ao fim de 1995 eu já era ateu, mas ainda não tinha a coragem de assumir isso para o mundo nem para mim mesmo. O momento da verdade eu vou contar no próximo post, isso é se ainda tiver alguém acompanhando.

Cheers

4 comentários:

Claudine Andrade disse...

...e eu ainda tenho a impressão de "levar na cara" de vez em quando. Talvez ainda não tenha desenvolvido essa desenvoltura para defender o ateísmo. Não falo DEFENDER no sentido literal. Mas como você disse, não saio tentando "angariar" seguidores. Não me dou a esse trabalho. Se alguém me pergunta, se interessa, tem curiosidade e quer ouvir... ótimo! Semana retrasada estava em um bar e começou a tal conversa ... Quando os religiosos começaram a se exaltar eu tomei mais um gole, ouvi com atenção e não "rebati". Acabei encontrando na mesa mais um Ateu, que teve a mesma postura. E a noite foi ótima ao final das contas. Adorei o Post!O lance da mitologia foi sutilmente genial. Mas é claro!!

Anônimo disse...

Continue, pois estamos lendo e gostando, mesmo que não escrevamos aqui.
Diferentemente de você, Nuncio, eu tive um fato marcante que foi quando dentro da Faculdade de Economia da atual UERJ, em 1977, um colega me fez a pergunta, mas decidamente inclinando-se para a negativa: E Deus existe? Naquela noite saí dali e fui efetuar raciocinios, o mais não lembro mais.

Diane disse...

PH, bacana ler sua história, não havia pensado como me tornei atéia, mas lendo sobre sua infância, passagem por escolas confessionais etc. não teve como não lembrar da minha história. Sou filha de um militante comunista e neta de uma vó católica, creio que foi ela que mais tentou nos converter. Nunca ouvi histórias biblicas (aliás, nunca li a bíblia), fiz primeira comunhão aos sete anos pque minha mãe achava que era uma tentativa de conter minnha vivacidade menineira. Fiz História em uma universidade católica (Campo Grand/MS, creio que foi nesse tempo que tomei ódio da religião, como todos estudantes e militantes, me intitulava atéia, mas sem convicção. Nessa última década é que me convenci de fato que religião é uma mer¨¨, isso se deu, sobretudo, pela convivência, aqui em Goiânia, com evangélicos e católicos insuportáveis,que justificam tudo pela religião. Sofro em ver as escolas públicas com nomes de santos, crianças rezando na escola e professores ameaçando a pequenada com a bíblia. Assumo isso para meus alunos na universidade e converso sobre minha opção com tranquilidade. Grata pela oportunidade de ler seu depoimento e me reportar a minha história, que talvez precisa ser melhor garimpada... Abraço
Diane

Unknown disse...

Legal que estão gostando e principalmente que essa retrospectiva esteja levando a relembrar o os passos que levaram cada um a cair na real e perceber que não tem sentido adulto acreditar em papai noel.

E se mais alguém quiser compartilhar sua história de conversão, aqui é o lugar.

Abraços