Esse segundo semestre de 2011 é muito importante para mim, pois passo oficialmente e ter mais de 50% da minha vida como ateu.
Sei que para muitos isso pode não significar nada, mas para mim, certamente é o fator principal que moldou todo meu pensamento, meus valores e a forma como encaro a vida. Tudo que eu sou hoje foi construído, muito com fundações no pensamento ateísta e tudo mais que ele carrega e representa.
O fato de saber que estamos aqui por nossa conta, sem nenhum amparo, e que a vida é uma só, (sem segunda chance), dá uma sensação de liberdade e responsabilidade que é impossível de se imaginar ter seguindo algum tipo de religião.
E para celebrar esse marco tão importante para mim, resolvi fazer uma retrospectiva de todas essas épocas: desde o passado religioso, as primeiras dúvidas, a pesquisa, a formação argumentativa - que levou a falar: “isso é uma besteira sem tamanho e não faz sentido” -, a culpa envolvida no primeiro momento em que se fala "não acredito em deus", o momento de assumir essa posição para a família e para o mundo, além de relembrar os primeiros livros, fóruns, debates e o engajamento.
Não sei se alguém irá ler. Mas sei que essa transição apesar de muito difícil, vale muito a pena. E sei lá, se ajudar a pelo menos a uma pessoa, já estará valendo.
Capitulo 1 - Quase um coroinha (ok também não foi para tanto)
Como grande parte da população brasileira, nasci e fui criado em uma família com religião definida, no caso, católica. Fui batizado logo após meu nascimento, estudei em um colégio católico, - Santa Marcelina, em São Paulo e minha casa sempre teve quadro de Jesus, bíblia, imagem de santa, essas coisas...
Quando menor, eu e meu irmão éramos incentivados a rezar antes de dormir, decorei o pai nosso e a ave Maria, mas confesso que o credo e salve rainha, nunca consegui.
Eventualmente íamos à missa.
Mas desde cedo, nunca gostei muito dessas coisas todas. Lembro de diversas ocasiões nas quais meu pai e meu irmão foram sozinhos à igreja enquanto eu preferia ficar em casa assistindo aos desenhos de domingo... apesar de ainda acreditar em tudo o que me estava sendo doutrinado. Apenas tinha preguiça de ir.
Na escola, tínhamos aulas de religião, nas quais eram passadas os “valorosos ensinamentos da palavra”. Porém uma coisa tenho que dar crédito ao Colégio Santa Marcelina: nunca tentaram passar o Gênesis como uma verdade e não o colocavam em pé de igualdade com a ciência de verdade. Talvez aí tenha sido o grande “erro” deles, inclusive. (Mas chegaremos nesse ponto nos próximos posts.) ;-)
Neste meio tempo fiz o catecismo e a famosa primeira comunhão, contando as aulas preparatórias. Eu tinha cerca de 11, 12 anos nessa época.
E foi ai, analisando retrospectivamente, que comecei a notar que tinha algo de muito diferente com essa tal de religião, por mais que na hora eu não tenha tido essa percepção.
Nas tarefas do curso, sempre que tinham as perguntas do livro, a professora que o ministrava, a freira (e aqui cabe um adendo, não chamo de irmã, pois, não sou irmão dela) Lúcia, sempre falava: “As repostas devem ser retiradas com pinça do livro”.
Sempre achei isso curioso, em todas as outras matérias nos era incentivado raciocinar, chegar às nossas conclusões, porém, nessa matéria, a tal da religião, a resposta deveria ser copiada letra por letra ou do livro texto, ou da da bíblia.
Mas, afinal, se é a palavra de deus, não tem sentido fazermos interpretações, conjecturas ou qualquer outra coisa, o que pode ser mais certo do que isso, não é?
E eu engoli isso, tomei como verdade na época, e o jogo seguiu.
Finalizei o curso, confessei, me preparei para o “dia mais importante da minha vida”, o dia que iria me alimentar com o corpo de Cristo.
(Uma pausa na narrativa para algumas considerações, pretendo fazer isso sempre que couber.)
Hoje vejo o tamanho da violência psicológica dessa situação.
Imagine uma criança com seus 11, 12 anos, sendo obrigadas a caçar em sua memória atitudes que ela tenha que pedir perdão, que são um crime aos olhos de um ser que vê tudo e sabe de tudo.
Francamente, qual a grande falha de caráter que alguém com essa idade pode ter, para que seja negada a entrada no “reino dos céus” caso não se arrependa?
Além de ter que fazer toda essa reflexão, tem que dividir isso não com seus familiares, nem com sua professora, amigos, psicóloga, etc. Mas com um sujeito que você nunca viu, mas aparentemente tem o poder de pegar todos esses “erros” que você cometeu e varrer para baixo do tapete.
Voltando, após a confissão e ao canibalismo simbólico, me senti bem, fazia parte de um grupo, era maduro, tomei “minha própria decisão” de fazer entrar na família católica, podia agora entrar naquela fila que todos entravam na missa, ainda acreditava, sentia até uma certa paz quando comia a bolachinha, estava inserido.
Logo após o ato, até participei mais das missas, afinal, agora podia participar de todo o ritual. Mas logo a empolgação passou, e voltei a preferir os desenhos e as séries que passavam na Globo, como Tal Pai, Tal Filho, Herói por Acaso e Anjos da Lei.
Mas ainda acreditava, eventualmente rezava a noite, agradecia, pedia, essas coisas.
E isso foi até os 14, 15 anos, fim do 1 grau, inclusive fiz minha crisma, quando você meio que confirma que você quer mesmo participar de toda essa “família”.
Mas posso afirmar que nessa época minha fé já não era mais tão inabalável, mas isso é tema para o próximo post.
Cheers